Quem lacra, não lucra? A falácia dos conservadores no entretenimento
A indústria do entretenimento muda constantemente, seja por conta das tecnologias que surgem ou pela necessidade de se adaptar a questões do mundo, como as paralizações por conta da Covid-19 ou as recentes greves de atores e roteiristas.
Dessa forma, uma das principais transformações da cultura pop nos últimos anos veio das lutas das minorias que buscavam conquistar direitos, além de se verem representadas nas telas. Mulheres, não-brancos, pessoas com deficiência e a comunidade LGBT começaram a marcar mais presença na frente e por trás das câmeras.
Começamos a ver casais gays protagonizando comedias românticas, histórias reais de pessoas pretas que lutaram contra o racismo indo para o cinema e mulheres protagonizando papéis que iam além de ser símbolo sexuais ou mocinhas indefesas.
A quantidade massiva de lançamentos que chegam cada mês nas plataformas dá a oportunidade de que cada consumidor consiga acompanhar o que bem entender, o que atende nichos cada vez mais específicos. Apesar disso, uma parcela do público têm se incomodado com o avanço da diversidade.
A FAMOSA “LACRAÇÃO”
“Lacre” se popularizou, a alguns anos atrás, como uma gíria da comunidade LGBTQ+ que significava “arrasar”, “mandar bem”. Com o tempo, passou a ser usada por conservadores de maneira pejorativa, para atacar pessoas e conteúdos que, supostamente, doutrinavam ou que empurravam “agendas políticas” goela abaixo.
Tudo começou quando as grandes companhias resolveram lembrar que grupos sub representados existiam e que poderiam ser retratados sem estereótipos. Por exemplo, com a alteração da etnia do Nick Fury nos quadrinhos e no cinema. Antes caucasiano, tornou-se negro e interpretado por Samuel L. Jackson.
O curioso é que as mesmas pessoas que surtam nas redes sociais com as mudanças no tom de pele Ariel, em “A Pequena Sereia”, ou Hermione, na peça de “Harry Potter e a Criança Amaldiçoada”, se calam quando a situação contrária ocorre.
Elas dizem que querem a sereia da Disney branca por ser fiel ao conteúdo original, no entanto, não reclamaram quando Scarlett Johansson ou Tilda Swinton foram escaladas para viverem personagens asiáticas. Não é contraditório?
A situação se agrava atualmente, pois essa repartição da internet decidiu que qualquer conteúdo protagonizado por minorias, automaticamente é “lacração”. Não acredita em mim? Procure os comentários de qualquer portal de entretimento e você vai encontrar centenas de posicionamentos de ódio.
Recentemente, a HBO estreou a animação “Young Love”, inspirada em um curta-metragem vencedor do Oscar, que conta a história de uma família negra. Na publicação em que o streaming divulgava a obra, usuários chamaram de “bosta”, “racismo reverso” e um ainda comentou que ficaria perfeito, caso a família fosse branca.
Parece absurdo, mas não estou inventando.
“AH, MAS NA MINHA ÉPOCA…”
Embora pareça contraditório, o povo que ataca produções atuais cresceu acompanhando seriados com protagonismo preto e adoravam. “Um Maluco no Pedaço”, “Super Choque” e “Todo Mundo Odeia o Chris”, para citar alguns.
O argumento usado é que, na época, os programas eram bons e não tinha “mimimi” ou militância. Esse tipo de pensamento mostra algo que já está óbvio, são pessoas ignorantes.
Qualquer telespectador que prestou atenção na série baseada na vida do comediante Chris Rock, percebeu que todo episódio contém várias críticas sociais.
Já no show que estrelava Will Smith, há uma cena muito famosa que crítica a violência do estado contra afrodescendentes. Um personagem está com as mãos erguidas, no tribunal, na frente de um policial
“– Você pode abaixar as mãos, Jazz.”
“– Nem pensar. O cara está armado, daqui a pouco ele dá seis tiros de advertência nas minhas costas.“
Diálogo do 9º episódio da 2ª temporada de “Um Maluco no Pedaço”.
Além disso, há um episódio inteiro de Super Choque que mostra o herói sofrendo com o racismo do pai de Gear. Falando nisso, para quem não sabe, o melhor amigo de Virgil, é gay.
Tudo o que falei nessa seção é apenas para demonstrar que crescemos com tópicos relevantes sobre preconceito e aceitação, só que hoje é mais comum. Mesmo assim, vai ter fã de X-Men, uma equipe cujo integrantes são marginalizados e oprimidos, reclamando de diversidade. É quase piada.
AFINAL DE CONTAS, QUEM LACRA, LUCRA?
Bom, com o tempo na internet, o ódio dos lançamentos considerados lacradores foi aumentando. Então, conservadores anunciavam boicotes o tempo inteiro, alegando que não dariam dinheiro a conteúdo que não os agradasse.
Ocorreu no Brasil, como foi o caso da novela “Babilônia”, exibida em 2015. Na época, evangélicos atacaram a produção por conta de um relacionamento lésbico entre duas idosas. Com o tempo, a criação da TV Globo foi considerada um grande fracasso.
No exterior, tivemos os casos do reboot de “Os Caça-Fantasmas”, lançado em 2016. O longa, que substituiu os personagens masculinos por um elenco todo feminino, causou revolta. No final das contas, a bilheteria foi péssima e muitos nem se lembrar da existência do filme.
Sendo assim, alguns diriam algo como “está vendo? o público não quer diversidade e lacração”. Porém, não é bem assim.
Ambos “Pantera Negra” e “Capitã Marvel” sofreram muitos ataques antes do lançamento. No primeiro, foi a primeira vez que o personagem principal da Marvel foi negro, já o segundo, marcou a estreia de uma mulher dominando na franquia. Um celebrava a cultura africana e fazia críticas ao imperialismo, o outro contava com uma feminista como estrela. Flopou? Pelo contrário, fez muita grana.
Os dois são as maiores arrecadações no cinema para filmes de origem da empresa. Cada um fez mais de um bilhão de dólares no período de exibição.
REPRESENTATIVIDADE É O FUTURO (E O PRESENTE)
“Lightyear”, primeiro longa da Pixar com um casal homo afetivo, não teve um bom desempenho. No entanto, “Vermelho, Branco e Sangue Azul” e “Heartstopper” são grandes sucessos.
“As Panteras” (2019) passou longe dos holofotes, mas “Barbie”, que despertou a fúria de homens machistas, é o filme do ano.
Faço esse comparativo para demonstrar que, ao invés do que é dito nas redes sociais, o que faz um conteúdo lucrar ou não, é, acima de tudo, a qualidade. Nem toda forma de entretenimento focada em minorias sociais vai encher o bolso dos empresários, mas elas estão aí pois conseguem encontrar suas audiências e brilham.
Recentemente, veio a público que a Disney apoiou um projeto anti-LGBT nos Estados Unidos, que proibia que qualquer assunto relacionado à diversidade sexual fosse debatido em escolas, podendo gerar processos. Logo, alguém acredita que quando a empresa do rato coloca personagens gays em suas franquias, é para abraçar os excluídos? Não, é justamente pois gera receita.
Bom, muita coisa já foi dita, portanto, quero saber a opinião de vocês. Comente!
A realidade é que os conservadores só começaram a se incomodar com os lançamentos depois que viram que não são mais os protagonistas de todas as histórias (em sua maioria homens brancos).