“O Brutalista” traz arquitetura e jogos de poder para derrubar o famoso sonho americano

“O Brutalista” traz arquitetura e jogos de poder para derrubar o famoso sonho americano
Guy Pearce, Adrien Brody, Felicity Jones, Stacy Martin e Joe Alwyn Em O Brutalista (2024) Foto/Divulgação

O Brutalista chega aos cinemas na próxima quinta-feira 20 de fevereiro, e para além da longa duração, o filme coloca um holofote sobre a sofrida situação dos imigrantes. Por meio da arquitetura, e dos jogos de poder entre os personagens, o longa resgata discussões profundas que todo refugiado busca por em pauta.

Vencedor do Globo de Ouro pelas categorias de Melhor Filme de Drama, Melhor Direção e Melhor Ator de Drama, além do destaque com as 10 indicações ao Oscar. O longa apresenta o judeu László Tóth, interpretado por Adrien Brody, que ganha mais uma vez um papel de destaque como um refugiado. Anteriormente, Brody viveu outro perseguido pelos nazistas, no filme O Pianista (2002). A presença e atuação de Brody é realmente inquestionável.

Ao deixar a Hungria em 1947 em direção aos EUA, Tóth se frustra com o famigerado sonho americano contado pelos quatro cantos do mundo. Os horrores do holocausto o faz buscar por uma vida melhor e esquecer totalmente os horrores da Segunda Guerra Mundial. No entanto, o país livre e próspero se mostra uma parede difícil de se quebrar. Após um trabalho para a construção de uma biblioteca na casa de um ricaço dar errado, os familiares viram as costas para ele. Tóth vê cristãos fechando suas portas, o racismo impregnado na sociedade e as oportunidades tão distantes quanto o sonho de uma vida melhor.

Quando tudo parece perdido, o bilionário vivido por Guy Pearce pesquisa sobre sua vida e descobre que ele era um arquiteto renomado em seu país. Ele volta atrás e surge com uma proposta para a criação de um centro esportivo. Para induzir Tóth a aceitar, ele traz amigos que prometem facilitar a vinda de sua esposa e sobrinha que ficaram para trás, além de uma boa remuneração e um lugar para morar.

O Brutalista

Adrien Brody e Guy Pearce em O Brutalista (2024) | Foto: Divulgação.

A direção do cineasta Brady Cobert dá enfoque no movimento brutalista quando o personagem de Adrien Brody faz daquela construção, o seu único objetivo por boa parte de sua vida. Talvez seja por isso que o filme é um dos queridinhos do Oscar.

As construções em linha reta, atenuadas por grandes blocos feitos com concreto foram adotados em muitas projetos pelo mundo durante o pós-guerra. O custo mas barato tanto na mão de obra quanto pela simplicidade no acabamento foram o que tornaram o estilo Brutalista um destaque.

Astúcia do roteiro e do filme como um todo não está apenas em destacar o estilo, mas em mostrar como o espaço se transforma com o tempo e o quanto da história conseguimos ver em cada edifício construído. Em O Brutalista, vemos um exemplo claro de como muita das vezes as cidades são construídas, feitas sem consultar a população e pior, sem pensar em sua utilidade. Quem decide o que vai ser feito é o cara rico da cidade, as pessoas influentes, o prefeito, a igreja. Mas ao povo mesmo, ninguém pergunta.

Os jogos de poder

Adrien Brody, Guy Pearce e Isaach De Bankolé em O Brutalista (2024) | Foto: Divulgação.

Permeado pelas relações de poder desde sua chegada aos Estados Unidos, László Tóth é mais um exemplo do que vive um refugiado. À mercê de favores, da pena de familiares, da bondade dos cristãos e principalmente do racismo e da xenofobia. É como se estivéssemos em sua pele, sem teto, comida, acesso a saúde e nem mesmo amigos. Enfim, sem direito a nada.

A imagética do cara rico e bonzinho que vem para salva-lo é quebrada quando o personagem demonstra que a situação em que ele se encontra não o define. Tóth é grato, mas não se permite ser uma marionete. Quando trazer sua família, dar casa, comida, um emprego e o mínimo de respeito não é o bastante, algo ainda mais devastaodor lhe acontece.

O Brutalista mostra que entender seu pertencimento no mundo vai além de não mudar quem você é. Tóth é um personagem abertamente inspirado em Marcel Breuer (1902-1981), arquiteto e designer de móveis húngaro. O protagonista destaca o que muitos judeus e outros refugiados viveram e ainda vivem. Por isso, a construção Brutalista construída no filme era tão importante. Sinônimo de força e resiliência estão diretamente ligadas ao que os refugiados passam a todo momento. Sobrevivem a grandes desafios e obstáculos, mas ainda assim permanecem de pé, como colunas fortes, resistindo ao tempo. E no futuro, se olharmos bem, aquelas paredes vão falar mais que os livros que não foram escritos por eles.

As 3h e 35 min valem a pena?

Cena mostrando a construção do centro esportivo e cultural de O Brutalisa (2024)

Confesso que se tirasse do filme diversos takes das paisagens, diminuiríamos cerca de meia hora, mas esses respiros para olhar ao redor são importantes. Se não para construção estética do tempo, que seja para pensar em como o espaço está sempre em movimento.

Um trem em locomoção, ruas sujas, uma mansão no meio do nada, uma montanha antes e depois de ser escavada, seja o que for. O que você vê hoje não é o que você verá amanhã e só o tempo te mostrará isso.

As críticas ao filme por suposto uso de inteligência artificial para alterar os sotaques dos atores não chega perto do olhar sensível para a situação dodos imigrantes. Ainda assim, ao sair do cinema me vem a seguinte questão: e os refugiados que não tem necessariamente uma profissão? O que mais eles estão sujeitos? Não que uma formação seja sinônimo de se dar bem em qualquer lugar do mundo, mas um olhar crítico é essencial para se viver e se entender no espaço onde vivemos. Quem não o tem, é um assujeitado ainda mais explorado.

Bom, percebemos isso quando o amigo que Tóth faz em uma fila para pegar comida, acaba virando seu mestre de obras. Até quando falamos de refugiados, um homem negro sempre está servindo um branco. Ainda assim, O Brutalista merece ser assistido!

Wesley Souza

Carioca, nascido em 1997, escritor, graduado em Publicidade e Propaganda pela UniCarioca (2022); Mestrando em Comunicação pelo PPGCOM/UFF e autor do livro "Marcado Para Zautar". Apaixonado pela literatura, sempre gostei de escrever e expor minhas opiniões.

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